União Europeia sob o guarda-chuvas dos BRICS, de Michael Krätke

24/10/2011 11:00
 

241011_brics1Rebelión - [Michael R. Krätke, Freitag, Tradução de Diário Liberdade] As cenas recordam o verão fatal de 2008, e, apesar de tudo, tudo é muito diferente: o drama tem lugar na Europa e nesta ocasião os Lehmann são resgatados. O pequeno banco grego Protonbank passar a ficar sob controle do Branco Central grego, o franco-belga Dexia segue no negócio graças às ajudas estatais francesas e é, de fato, nacionalizado. Ninguém quer se arriscar a um crash bancário, e isso por boas razões. Só Dexia é tão grande como todos os grandes bancos gregos – os grandes credores da dívida grega – tomados conjuntamente. Começa outra rodada de resgate dos bancos europeus, mas com isso não se diminui a crise europeia. Aos hiperativos, hipernervosos e qualquer coisa menos racionais "mercados" e aos políticos profissionais em seu espetáculo amador a respiração está afobada.


A última reunião do Fundo Monetário Internacional foi muito reveladora: a nova diretora do Fundo, Christine Lagarde, pediu ao Banco Central Europeu que rompesse seu maior tabu e comprasse mais títulos da dívida da zona do Euro, pelo valor, nada menos, de 100 a 200 bilhões de euros. Não tardou em se ouvir a resposta desde a Alemanha: Aonde iríamos parar se o Banco Central Europeu se colocar a interpretar o papel de prestamista de última instância e com isso sugere a todo mundo que após nosso dinheiro não está o crédito estatal, mas a máquina de imprimir cédulas? De se chegar a conhecer, poderia ser perigoso.

Tanto ou mais interessante que a declaração de Christine Lagard foi um encontro longe dos olhos do FMI. Ali se reuniram os chamados estados BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), em cujo crescimento e reservas monetárias agora todo o mundo confia. A República Popular da China dispõe de mais de 3 trilhões e 200 bilhões de dólares em reservas de divisas; o Brasil mais de 352 bilhões; a Índia mais de 320 bilhões; a Rússia mais de 543 bilhões. Todos são potenciais investidores e agora tem uma quinta ou quarta parte de suas reservas em títulos europeus. Só a Rússia mantém com estes empréstimos 45% de seus ativos.

De bom grado

Se este grupo de estados colocar todo seu peso no prato adequado para fazer bascular a balança a favor do euro nos mercados financeiras, a zona do Euro ficaria estabilizada. Reforçar a moeda europeia como rival do dólar aparece como uma opção tentadora para os Estados BRICS. Mas este cenário tem lugar também com a precaução de não danificar os próprios interesses comerciais no espaço europeu. Os chineses compraram desde janeiro repetidamente bônus do plano de resgate europeu bem como títulos da dívida da Grécia, Espanha, Itália e Irlanda. Entretanto, fizeram-no em uma medida limitada, para tranquilizar os atores dos mercados financeiros. Os negociadores italianos e gregos se preocuparam também em fazer vistas grossas à exportação massiva de capital aos seus Estados.

Os investimentos e a participação direta na florescente indústria europeia e em iniciativas comerciais na Europa são promovidas em Pequim. Por que deveriam os chineses entretanto adquirir fundos do Estado ou os desvencilhados bônus do tesouro dos países da União Europeia mais endividados? Se a Europa emite eurobônus, comprariam de bom grado no distante Oriente. Em sua última viagem à Europa, o primeiro ministro Wen Jiabao disse repetidamente que a China queria se envolver mais na União Europeia, mas só em troca de abandonar sua almofada macia de divisas. Entre outras coisas, tratar-se-ia de esperar concessões em matéria de política comercial, como a aceitação de um yuan artificialmente barato, em parte graças às enormes reservas em dólares. Apesar de tudo isso, os Estados Unidos trabalham nos bastidores para que a ajuda de todos os estados BRICS se limite a operações de resgate formais para o Euro. E, contudo, os brasileiros se mantém reservados, os indianos são capazes de atuar só até certo ponto e os chineses pensam em levar a cabo a troca de seus bilhões em uma posição melhor na Organização Mundial do Comércio – OMC, mas também, e sobretudo, no FMI e no Banco Mundial, onde buscaria, com a assistência da União Europeia, uma posição predominante. Esse poderia ser um trato possível.

O Japão – todavia um dos maiores países industriais – tem, apesar de sua enorme dívida estatal de 220% de seu PIB, a mesma vontade manifesta de comprar bônus do tesouro europeu. Para Tóquio muito mais está em jogo: a retirada dos investidores europeus do mercado de bônus japonês (bônus samurai) enquanto a debilidade do euro freia marcadamente a economia exportadora japonesa.

Michael R. Krätke é membro do Conselho Editorial de SINPERMISO, é professor de política econômica e direito fiscal na Universidade de Amsterdã, investigador associado do Instituto Internacional de História Social dessa mesma cidade e catedrático de economia política e diretor do Instituto de Estudos Superiores da Universidade de Lancaster no Reino Unido.

 

Fonte: diarioliberdade.org