Morre Kadafi e, com ele, o nacionalismo árabe do século XX, do site do PCO

21/10/2011 13:54
21 Outubro 2011 02:00

211011_khadafi-500x300PCO - De representante do nacionalismo árabe a serviçal do imperialismo.


No dia 20 de outubro de 2011, Muammar Abu Minyar al-Gaddafi foi morto pelas forças do governo de transição, na sua cidade natal, Sirte. Com ele fecha-se o ciclo dos governos nacionalistas árabes inspirados no líder egípcio Gamal Abdel Nasser.

Aos 17 anos, Kadafi ingressou na Academia Militar de Benghazi. No primeiro ano do curso, formou um grupo de opositores ao governo do rei Idris I que, nos últimos anos, tinha aprofundado a submissão aos imperialismos norte-americano e inglês. Em 1º de setembro de 1969, o então Coronel Kadafi, que na época tinha 27 anos, foi um dos líderes do golpe de estado nacionalista encabeçado por um grupo de jovens oficiais, inspirados em Nasser.

Após a tomada do poder, o novo governo fez a reforma agrária, que deu dez hectares, trator e implementos agrícolas a cada família, e nacionalizou o petróleo, que é a base econômica do País, proibiu a exportação de petróleo para os EUA, confiscou 200 multinacionais imperialistas e nacionalizou o crédito através do Banco Central Estatal. Com os recursos obtidos da exploração do petróleo, implementou melhorias nos programas sociais, principalmente educação e saúde. Ampliou a participação dos trabalhadores na gestão das empresas estatais e das mulheres na sociedade. Expulsou as bases militares norte americana e inglesa, os colonos italianos, que continuavam no País desde a invasão que aconteceu poucos anos antes da Segunda Guerra Mundial, e as comunidades judaicas. Até os anos 80, patrocinou e apoiou organizações políticas e países que lutavam contra o imperialismo norte-americano e os sionistas israelenses, como por exemplo o Fatah e vários outros grupos palestinos, os Panteras Negras nos EUA, etc. Impulsionou o pan-arabismo através de várias tentativas de unificação com o Egito e Síria; após fracassar, assinou um protocolo de união total com a Tunísia, mas também fracassou. Organizou o afundamento de navios imperialistas no Mediterrâneo, atentados contra o governo de Israel, disparou mísseis contra a Sicília e enfrentou os imperialismos norte-americano, britânico e francês.

Em 1986, o imperialismo norte-americano lançou ataques aéreos contra Trípoli e Benghazi e impôs sanções econômicas contra a Líbia, sob a alegação de que o governo líbio teria apoiado um atentado a bomba numa discoteca em Berlim.

Em 1993, Kadafi reestrutura o exército líbio após um grupo de altos oficiais terem fracassado numa tentativa de golpe de estado. Os altos mandos passaram a ser controlados por pessoas de sua estrita confiança e membros da sua família. As tropas de elite e os armamentos pesados foram concentrados em Trípoli sob o comando de um de seus filhos, o que facilitou a contraofensiva contra os rebeldes no início deste ano.

Ainda no mesmo ano, Kadafi sofreu um atentado de um movimento islâmico radical, e, em 1998, um novo atentando que também fracassou.

O esgotamento do governo nacionalista de Kadafi

No início dos anos 90, o regime começa a dar sinais de esgotamento. Com a queda do preço do petróleo, a economia, que não fora diversificada, desacelera, piorando as condições de vida das massa trabalhadoras, o que gerou o aumento da oposição interna.

Com o neoliberalismo em pleno auge, Kadafi inicia uma aproximação com o imperialismo. Em 2003, anuncia que desistirá das armas de destruição em massa e que se juntará à guerra ao terror, liderada pelo imperialismo norte-americano, que logo depois suspendeu as sanções contra a Líbia. Em seguida, os principais setores petrolíferos foram entregues as multinacionais imperialistas, e o mesmo acontece com outros setores estratégicos da economia.

Em agosto de 2008, a Líbia estreitou as suas relações econômicas com a Itália. A Itália pagou à Líbia US$ 5 bilhões como indenização pela ocupação militar na época de Mussolini e obteve o comprometimento do governo líbio no combate à emigração ilegal, além de várias vantagens para as multinacionais italianas, principalmente as petrolíferas. O petróleo líbio passou a representar 10% do consumo italiano.

Acordos similares foram feitos com outros países imperialistas europeus, tais como a Grã Bretanha, a França e a Espanha.

As privatizações foram acompanhadas de grande corrupção que enriqueceram os círculos próximos à família Kadafi, sob a supervisão e apoio do FMI (Fundo Monetário Internacional).

A aplicação da cartilha do neoliberalismo na Líbia piorou sensivelmente as condições de vida das massas trabalhadoras, que foram muito afetadas com a subida dos preços dos alimentos e a eliminação dos subsídios aos serviços públicos, o que acabou impulsionando várias revoltas que precederam a última grande mobilização popular que estourou em março deste ano.

Os rebeldes conseguiram, inicialmente, tomar várias cidades importantes do País chegando inclusive até as portas de Trípoli. Mas o núcleo fundamental do exército e os armamentos, que estavam concentrados na cidade, assim como o uso de mercenários possibilitou um forte avanço das tropas governistas até a cidade de Benghazi, foco da revolta. O imperialismo apoiou os setores de direita dos rebeldes e iniciou um processo repressivo para destruir os elementos independentes e tomar conta da oposição e começou bombardeios no País com o objetivo de enfraquecer as forças do governo e também os setores revolucionários dos rebeldes, inclusive chegando a cogitar a possibilidade de dividir a Líbia. O verdadeiro objetivo do imperialismo era o controle do petróleo, pois a produção, antes de março deste ano, era de 1,6 milhões de barris diários e as reservas de 50 bilhões de barris de óleo leve, o de melhor qualidade da África.

Em agosto de 2011, as tropas rebeldes tomaram Trípoli. O CNT (Conselho Nacional de Transição) foi reconhecido como governo na Líbia pelas principais potências imperialistas e vários outros países. Kadafi e o restante das suas tropas refugiaram-se em Sirte e algumas outras cidades, que foram bombardeadas pela OTAN e atacadas por terra pelas tropas do CNT. Em 20 de outubro de 2011, Kadafi é capturado e morto.

O CNT, dominado pelos setores controlados pelo imperialismo norte-americano e europeu, é o principal mecanismo de freio ao avanço da revolução na Líbia. Mas as suas contradições internas são ainda mais profundas que as existentes no governo de Muamar Kadafi, e poderá enfrentar, no próximo periodo, a oposição de diversos grupos militantes armados e, principalmente, o avanço das massas trabalhadoras devido ao aprofundamento da política de espoliação do imperialismo.

A debilidade do nacionalismo em combater o imperialismo até o fim, uma vez que não é capaz de expropriar o capital e apoiar-se nas massas, mas procura usar as massas para se contrapor à pressão do imperialismo, sendo mais fraco que ambos, conduz à sua decadência e ao seu submetimento ao imperialismo, o qual, frequentemente traz consigo a liquidação do nacionalismo dependente pelo próprio imperialismo quando perde o apoio das massas.

A derrocada de Kadafi ilustra uma vez mais esta que é uma das leis fundamentais da revolução em nossa época.

A crise conjunta de todo o nacionalismo árabe, da qual a liquidação de Kadafi nas mãos do imperialismo é um dos últimos capítulos dessa agonia. Essa crise, no entanto, não significa a vitória ou o fortalecimento do imperialismo, mas é um capítulo do aprofundamento da crise revolucionária nos países árabes e nos países atrasados de um modo geral.

 

Fonte: https://diarioliberdade.org/index.php?option=com_content&view=article&id=20779:morre-kadafi-e-com-ele-o-nacionalismo-arabe-do-seculo-xx&catid=241:direitos-nacionais-e-imperialismo&Itemid=156