Centenário de Nelson Werneck Sodré, por Lincoln Secco
Centenário de Nelson Werneck Sodré
Por Lincoln Secco.
Cem anos depois, Nelson Werneck Sodré começa a ser resgatado do esquecimento a que a universidade brasileira o havia condenado. A USP, que tanto dissabor causava ao velho General, recentemente nomeou uma sala do seu Departamento de História com o nome dele, por iniciativa do Professor Marcos Silva, também organizador do Dicionário Crítico Nelson Werneck Sodré.
Para conhecer a trajetória de Sodré nada melhor do que ler o seu melhor livro: Memórias de um Soldado. Por ele observa-se o impacto da Revolução de 1922-1930 sobre a formação de toda uma geração de militares e civis que expressavam a rebeldia das classes médias.
Sodré assistiu à Revolução de 1932, a qual apoiou e depois criticou. Teve a experiência com a fascistização militar pós-1930, revoltou-se contra o racismo imperante no Colégio militar que seria erguido em São Paulo, ascendeu à Escola de Comando Militar por mérito nos anos de 1940, associou-se à chapa nacionalista ao Clube Militar nos anos de 1950 e seria por isso desterrado para Cruz Alta (RS).
Ali deu aulas de História Militar, comandou tropa e conquistou até mesmo a simpatia de um comandante conservador. Calou-se contrariado diante de uma ou outra injustiça do Exército contra pessoas pobres – o Major que já era engolia a seco aquilo que o jovem tenente teria questionado nos anos de rebeldia.
Werneck Sodré tinha simplesmente descoberto a necessidade de amparo político para fazer política, o que faltava aos nacionalistas, comunistas e ao próprio Getúlio Vargas! Ou seja, Vargas demonstrara que tinha radicalizado sua política sem um dispositivo militar correspondente.
Afastado no Governo Jango, passa à reserva como General de Brigada e dedica-se à Escola Nova de História no ISEB. Sofre o Golpe de 1964: o fascismo cotidiano, a humilhação de oficiais nacionalistas, a quebra da hierarquia e da disciplina pelos golpistas, a desonra das Forças Armadas, a submissão aos Estados Unidos e a ruptura com sua tradição supostamente democrática.
Se as Forças Armadas quiserem se reconciliar com a nação, deveriam começar por editar as Memórias do Soldado Nelson Werneck Sodré, um patrimônio da cultura brasileira.
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Lincoln Secco é professor de História Contemporânea na USP. Publicou pela Boitempo a biografia de Caio Prado Júnior (2008), pela Coleção Pauliceia. Colabora para o Blog da Boitempo mensalmente, às sextas-feiras.